Em 2017, foi sancionada a Lei 13.429, que modificou a Consolidação das Leis do Trabalho, ampliando as hipóteses de terceirização de mão de obra. Porém, em um país com rígido controle de normas trabalhistas, há viabilidade para implementação de serviços terceirizados com real garantia jurídica? Ou seja, é possível terceirizar sem que, posteriormente, seja reconhecido um vínculo empregatício que gerará inúmeros custos ao contratante? E como aplicar isso no âmbito da administração pública?
O que é atividade-meio e atividade-fim?
Para contextualizarmos, é necessário entender que existem dois tipos de atividades em uma empresa privada ou na Administração Pública: a atividade-meio e a atividade-fim.
Atividade-meio é aquela não inerente ao objeto principal da pessoa jurídica, ou seja, trata-se de um serviço necessário ao seu funcionamento, mas que não tem relação direta com a sua atribuição principal. É um serviço não essencial.
A atividade-fim, ao contrário, é aquela que caracteriza a atuação principal da pessoa jurídica, normalmente expresso no objeto do contrato social, em se tratando de uma empresa privada, e nas normas constitucionais ou infraconstitucionais, que definem a competência no caso da administração pública.
Quanto à terceirização de mão de obra enquanto atividade-meio, ressalvadas eventuais divergências de alguns Tribunais no país, sempre restou reconhecida a possibilidade e legalidade do ato de contratar terceiros para a execução dessas atividades.
Porém, grande discussão se dá em relação à atividade-fim, cujo entendimento quase que unânime da Justiça do Trabalho é a da ilegalidade nesse tipo de contratação.
Ocorre que, em julgamento realizado no mês de junho de 2020, o STF decidiu pela constitucionalidade da Lei 13.429/17, reconhecendo a licitude da terceirização mesmo em relação à atividade-fim.
Nas palavras do Ministro Gilmar Mendes, relator das Ações Diretas de Inconstitucionalidade números 5.685, 5.686, 5.687 e 5.735, cujo julgamento se deu conjuntamente:
“Quando se reconhecia que a terceirização dizia respeito à atividade-fim, era considerada ilegal e se reconhecia o vínculo de emprego diretamente entre os trabalhadores terceirizados e a empresa tomadora dos serviços. O STF consignou, então, que a Constituição não impôs modelo específico de produção e que a terceirização não traz consigo necessária precarização das condições de trabalho.”
Atividade-fim e atividade-meio na Administração Pública
Neste contexto, a terceirização, digamos, ampliada pela Lei 13.249/17, é um instituto relativamente novo, cuja constitucionalidade, como visto, somente veio a ser decidida no ano de 2020 pelo STF.
Quando do julgamento antes referido, e tratando diretamente de cargos públicos, o Ministro Gilmar Mendes afirmou que:
“contratação de empresa de serviço temporário para terceirizar o desempenho de determinadas atividades dentro da administração pública não implica em violação à regra do concurso público, uma vez que não permite a investidura em cargo ou emprego público, devendo a Administração observar todas as normas pertinentes à contratação de tais empresas.”
Como exemplo, no âmbito da Administração Federal, tal entendimento do STF deverá implicar em uma revisão do Decreto 9.507/2018, onde consta que não serão objeto de execução indireta (terceirização) na administração direta, autárquica e fundacional, os serviços:
- que envolvam a tomada de decisão ou posicionamento institucional nas áreas de planejamento, coordenação, supervisão e controle (atividades-fim);
- que sejam considerados estratégicos para o órgão ou a entidade, cuja terceirização possa colocar em risco o controle de processos e de conhecimentos e tecnologias (atividades estratégicas);
- que estejam relacionados ao poder de polícia, de regulação, de outorga de serviços públicos e de aplicação de sanção (atividade-fim);
- que sejam inerentes às categorias funcionais abrangidas pelo plano de cargos do órgão ou da entidade, exceto disposição legal em contrário ou quando se tratar de cargo extinto, total ou parcialmente, no âmbito do quadro geral de pessoal (atividades-meio, porém com superposição do plano de cargos e salários, configurando “terceirização de mão de obra”).
A edição desse Decreto se deu, primordialmente, para uma adaptação da realidade ao entendimento da Justiça do Trabalho de que não caberia a terceirização de atividade-fim.
Ocorre, porém, que como já visto, esse modelo cai por terra no momento que o STF entende como constitucional a terceirização da atividade-fim. Aliás, o Ministro Gilmar Mendes afirma que os critérios de atividade-fim e atividade-meio não encontram mais guarida na realidade atual.
Adaptações também ocorrerão nas demais esferas públicas, inclusive no âmbito das autarquias e fundações públicas.
Terceirização da atividade-fim na Administração Pública
A modificação realizada pela reforma trabalhista (Lei 13.429/17) passa a ser reconhecida pelo STF como constitucional em julgamento com repercussão geral, ou seja, cuja decisão tem efeito vinculante para todo o Poder Judiciário.
É reconhecido por muitos que o tema é uma forma de modernização das relações trabalhistas e, por decorrência, uma imposição da necessidade da diminuição dos custos gerais e operacionais da máquina pública e empresas privadas.
Se, antes, a terceirização era viável apenas na atividades-meio, agora ela poderá ser adotada nas atividades-fim, ou seja, uma escola poderá ter professores terceirizados, por exemplo.
Importante ressaltar que abusos devem ser coibidos e que, antes de se terceirizar uma atividade, é preciso uma boa análise por parte do gestor público ou empresário no intuito de reduzir riscos e evitar a configuração de uma relação trabalhista direta.
Leia também: Improbidade administrativa: cresce movimento contra irregularidades
Quais cuidados o gestor público deve ter?
Para a administração pública, é necessária uma assessoria técnico-jurídica qualificada, pois leis, normas e outros regulamentos necessitam de uma adequação para a implementação da terceirização, sob pena do gestor responder por eventuais prejuízos causados aos cofres públicos.
Ademais, durante todo o período em que terceirizados estiverem atuando, análises, relatórios, conferências de documentos de regularidade da empresa contratada e inúmeros outros requisitos e critérios terão que ser observados.
Se você é gestor público ou empresário fornecedor de qualquer esfera do governo, conte com nosso conhecimento e experiência no Direito Público para orientar e auxiliar na sua tomada de decisão. Entre em contato e saiba como podemos ajudá-lo.
Whatsapp (51) 99379.8538
Fone (51) 3542.1200